quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Cartas "esquecidas"



Cartas jogadas sobre o chão da sala, cartas memorizadas em cada rabisco de palavras erradas, cartas lembradas e agora esquecidas, ela abriu a porta da sala e rodeou a casa , como se pensasse em fazer mais alguma coisa, não encontrou o que queria voltou e sentou-se novamente no chão e as leu novamente, as leu pela última vez, ela sabia que aquele era o último momento que as veria, elas não mais a pertenceria, pertenceriam a terra ou qualquer outra pessoa que as encontrasse, pensou em queima-las, queima-las não, queria que fossem gravadas na memória de alguém como ficaram na sua memória um dia, queima-las seria como aniquila-las de seu poder sensibilistico e isso não era a sua vontade. Enterra-las, sim, enterra-las na porta da sala, elas se degenerariam com os meses e se transformariam em pó, lembrou-se do que o professor falara um dia, que petróleo são restos decompostos de florestas e animais da antiguidade, para ela suas cartas eram parte de uma floresta, os papéis foram um dia árvores derrubadas e cortadas, transformadas em páginas vazias, sim suas cartas se transformariam em petróleo, alguém as usaria um dia sem saber de sua importância sem notar que o líquido homogêneo um dia fora uma carta branca cheio de vazios de alma. Mesmo que não fosse verdade isso a fazia feliz, acreditar que suas cartas um dia teriam um preço que hoje não tinham. Pensou novamente e chegou a sua teoria, Petróleo? para quê transforma-las em em algo valioso que poderia ser usado para fazer mal a alguém? Não, ela não queria que suas cartas fossem lembradas como parte de algo ruim queria transforma-las em delicadeza de espírito... Não as enterraria para que virassem pó, as enterraria para que virasse lembrança e história. Foi até o quarto e trouxe uma caixinha de plástico retangular, sim, as colocaria e as enterraria como se fosse um tesouro perdido que seria encontrado um dia, as dobrou vagarosamente e junto com elas colocou um pingente, seu único pingente de ouro, não exatamente ouro mas banhado a ouro, escreveu a última anotação em uma folha branca e colocou por cima do entulho das cartas.

"Vazios de uma alma esquecida"

Imaginou uma criança brincando no terreiro e encontrando aquela preciosidade secreta, leria vazios de uma alma e não entenderia nada, chamaria a mãe na cozinha e contaria sobre o seu tesouro encontrado, a mãe leria as cartas e as guardaria como lembranças encontradas de uma alma vazia e esquecida, apenas isso e elas passariam de geração em geração naquela família...

Imaginou outra hipótese, uma adolescente de aproximadamente 17 anos rodeava a casa como ela fizera naquela tarde, seus olhos estavam vermelhos, seus cabelos negros bagunçados, estava descalço, pegou alguma coisa escondida na área, uma faca, ela segurava a faca e voltava em direção a porta da sala, sentou-se debaixo da arvorezinha que enfeitava o terreiro e chorava incontrolavelmente, deitou a cabeça sobre os joelhos e brincava de passar a faca sobre seu pés, levantou os olhos passou com força o lado contrario da faca sobre os pulsos, e a lançou sobre a terra úmida, percebeu que perfurava algo de baixo da terra, houve dor dentro si ao imaginar que poderia estar perfurando o casco de um inocente tatu que dormia de baixo da terra fresca, tirou a faca, e teve imensa curiosidade em descobrir o que havia estragado seus possíveis últimos momentos de vida, começou a desenterrar e revirar a terra, suas mãos frágeis e sujas alegraram-se ao encontrar uma caixa de plástico, ressecada e desbotada, havia uma perfuração na tampa e ao abrir deparou-se com papéis dobrados, por cima escrito a seguinte frase: "Vazios de uma alma esquecida" abriu um sorriso ao ler a frase em pensamento, pois era justamente o que sentia, vazio, vazio na alma, sentia-se como uma alma esquecida e aniquilada, mais que rapidamente descobriu-se todas elas e pôs-se a lê-las, percebeu que a autora das cartas contava seus vazios de alma descrevia derrotas e vitórias, as vezes chorava com as palavras as vezes sorria com elas, tampou o buraco que ficara na terra, e esqueceu-se a faca jogada debaixo da árvore foi até seu quarto e terminou de lê-las com maravilhosa paciência, a autora na época com 22 anos chorava na carta seguinte e sentia-se como alma vazia e fragilizada, abandonada sobre o teto do mundo, escrevia a alguém que não conhecia contava sua vida como se tivesse certeza que alguém com as mesmas dores as encontraria um dia, levantou-se da cama e as guardou novamente do jeito que as havia encontrado, ao pô-las percebeu alguma coisa no fundo da caixa, era um pingente, pequeno e brilhante uma tartaruguinha com olhinhos de vidro que a olhava como se tivesse vivenciando aquele momento, ela sorriu ao coloca-la no fundo novamente, olhando para a perfuração da caixa pensou em reconstruí-la, mas desistiu ao pensar que sempre se lembraria daquele momento, abriu a última gaveta da cômoda e a guardou. voltou para a sala e lembrou-se da faca jogada no terreiro foi à pia a lavou e a guardou na gaveta da cozinha, olhando para as unhas sujas de terra olhou no espelho e prendeu o cabelo num coque, pegou a toalha e foi para o banheiro, em seguida viu na mesa da sala um livro, Tempos de neve, esse era o título, deitou-se no sofá e pôs -se a lê-lo durante toda a tarde, esperando o retorno da mãe....

Ela gostou da segunda hipótese, e com um sorriso meigo no rosto enterrou a caixa, sentada na porta da sala admirou ao notar que alegrava-se ao ver o sol se pôr, e mais uma vez sorriu, fechando a porta da sala.

domingo, 31 de janeiro de 2016

O bichinho do códigos de barras


Não deveria passar de seus 19 anos, era o máximo que ela poderia atingir, sua aparência mostrava isso, nem lembro se ela deu um boa tarde, hum, acho que deu e acho também que na hora fiquei com preguiça de respondê-la, ela passa as mercadorias da minha cestinha com uma rapidez quase sobrenatural, e já vai embalando tudo não era feia e nem bonita, era bonitinha, sim, essa é a palavra certa, o seu rosto não combinava com "bonita", tinha um rosto tranquilo, usava um rabinho de cavalo, uma franja atrás das orelhas. Ela olha para a tela do monitor, e diz o valor das minhas compras, pede algumas moedas, acho que era para facilitar o troco, tirando a minha nota de cem na carteira, digo não ter, aff... acho que eu tinha mas ... Ela faz uma expressão não muita satisfeita ao receber a minha nota de cem e pergunta se eu não tinha uma cédula menor, balanço a cabeça como negativo, ela pede a frente de caixa para trocar, Aff... eu deveria ter dado minha nota de 50, agora vou ter que ficar aqui esperando... Só para atrasar. Enfim o meu troca chega 85,95 confesso que aquela altura a minha expressão não era a das melhores emburrado pego minhas sacolas, e dou de costas, cumprindo mais uma parte da minha rotina.

Eu não sei porque as pessoas acham que somos culpados por não ter troco, também cobrar R$4,05 em cem reais está de brincadeira não é todos os dias que o troco está bom para sair cobrando 2 reais em nota de cem, se está atrasado poderia ter dado trocado ou nota menor, as pessoas pensam apenas nelas esquecem que por trás de um leitor de códigos de barras existe um ser humano como qualquer uma delas, um ser humano que cansa com o seu trabalho, Boa tarde, boa noite, acho que perdi as contas quem o responde, notas e moedas jogadas sobre o caixa como se fossemos um certo bichinho que deveria pegar todas com a carinha melhor possível após um ato mal educado, -Vou deixar minhas sacolas aqui fica de olho nelas, sim, de olho com a fila enorme com pessoas emburradas a espera de serem atendidas.

-O preço lá está errado! isso é tanto não é esse tanto que você registrou aí não!

-Ah sim, vou olhar para você... A senhora se enganou esse é realmente o preço, você olhou o preço errado, esse é vidro, o outro é plástico.

-Então eu não vou levar...

-Cancela pra mim!

Entre bons dias e boas tardes mal respondidas ou não, vai-se minha rotina completando mais um ciclo.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Como se fosse o futuro




Você entra com olhar avermelhado e triste de sempre, com o guarda chuva nas costas passa pelas batatas palhas e as aperta como se estivesse as examinando.

Vai até o hortfruti e faz o mesmo com as verduras, de longe eu te observo sim, um olhar triste e parado como se não tivesse mais expectativas, será as manchas pelo seu corpo? Continuo a te obeservar como se você fosse minha obra prima, e você sabe disso, você sabe que te observo porque você se parece com meu futuro é como se o futuro pudesse olhar para mim, é como se ele quisesse me dizer alguma coisa, é como se houvesse mais alguém como você. Um temporal, as águas vermelhas ficam a ponto de invadirem o supermercado, as pessoas observam a chuva admiradas paradas à porta, mas você sabe que você é o personagem principal do meu quadro, o personagem, com o guarda chuva em mãos, o personagem de cabelos brancos, o personagem de rosto triste e amargurado, você observa duas moças conversando ao balcão e as olha com ar de curiosidade sem maldade, e por um momento você se tornou outra pessoa seu rosto se transformou e tomou uma expressão de sastifação, mas apenas por um momento, você vira-se e olha a chuva novamente, com o olhar de sempre, olhar vago e parado nas aguas vermelhas da enxurrada. Eu não te vejo ir embora, quando olho você não está mais lá como sempre faz;

Como pode se parecer tanto? na praça sentado olhando os pombos brincarem em um canto, sentado com o boné acinzentado, você e seu amigo agora observam a rua você e seu guarda chuva sozinhos, observam a vida em movimento, eu os olho e passo como se não houvesse importância alguma para mim, passo e dou as costas com a certeza, de que algém vivera a mesma vida, como se o futuro ou o presente quisesse me alertar. Você sabe que te observo, talvez não saiba, mas isso não faz mais sentido, isso não é contagioso e você pode sorrir, como qualquer outra pessoa faria. Boa tarde, obrigada, sacola? Não me responde apenas vai embora e toma o seu destino. È como se houvesse mais alguém pedindo socorro é como se a sua vida fosse convertida em mais alguém, isso faz sentindo? Porque me dá vontade de desabar? Porque uma certa afinetada insiste em alfinetar meu coração quando olho para o seu rosto? Sim talvez seja, talvez seja uma certa sensibilidade em olhar as dores alheias.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Antes dos 20


Hoje findo com os meus 19... Sim 19 que outrora eu achava ser uma centena de anos, 19 que agora abandono com o coração na mão , é como um friozinho na barriga no primeiro dia de aula. É como se eu estivesse completando 30 anos, lembro-me quando abandonava os meus 18 e recebia os 19 com apreensão mas logo me acostumei afinal era mais um ano com com o 1 como primeiro algarismo na idade. Ainda eu ouviria muito a frase que tanto me dava felicidade: Nossa como você é novinha!
Sim 18, 19. E agora  as 00:00 20. Duas décadas de existência... fiquei  toda a semana pensando nas minhas sensações nas minhas inseguranças enquanto aguardava os 20, e percebo que não mudei nada continuo a ser aquela menina de 15 anos do colegial, aquela menina que ainda morde as bochechas da mãe que aperta as pessoas e crianças como se fossem bichinhos de estimação, menina que o pavor das bochechas dos primos mais novos. Sim menina, que começa a desconfiar que esse adjetivo não mais fará sentido no seu nome. Menina mulher, mulher embora ainda ser menina.